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Sento ao fundo do quarto, já
pousando a mão aflita na escrivaninha quase abandonada, empoeirada e refletindo
o último ato. Que criação virá dessa luz meio estridente que vai rumando dentro
de mim como um cais abandonado?
Aguardo o que me vem,
completamente absorvida por essa luz que adquire a cor amarelada que tanto
gosto, no exato momento de uma inquietação dolorida - o que se pode chamar de
um furor antiquado e em horas impróprias. Não se assemelha a nada dessa época.
Tempo meu, uníssono e
desconhecido. Passam os minutos pausadamente, sem pressa. É hora de criar a
ficção do abandono e o mergulho na solidão que recolhe os olhos marejados da
realidade sem graça.
Tudo pronto, coisas tão
irresponsavelmente gastas, farsantes, de uma organização selvagem e medíocre
dentro do meu corpo. Insanas e originais. Engatinhando como um filhote
independente dos irmãos - ele, que não soubera desde cedo o pesar do outro em
seus ombros.
Decidida a ser livre, como
ele, sem ainda ser. Quisera.
Não sou, nem desejo tamanha
organização de pecados como a expulsa do paraíso, ali onde se falou de um
suculento fruto proibido que fizera da nossa causa uma luta miserável. Não
quero morrer por esse fruto, quero dele o sabor, o toque, a posse.
Da organização do mundo é o
que falo. Esse novelo de cores misturadas, confundindo o pecado com o perdão; o
que não se ajuíza; desmonta cabeças e as junta num encontro de realidades.
O infinito ousando se
entender.
Gritos espraiam soltos no
ar. Compreendem tudo com agudeza de sentimento esparso e findo, de quem já
morreu ou esboçou um sorriso pela última vez na vida.
É o recomeço! - Gritam com
ânsia de vida. Estão perdidos na marginal e compreendem o incompreendido
por um dia. Almas emaranhadas no sentido da coisa rarefeita.
Ouvem, lá de baixo, o grito
do absurdo que solto aqui de cima como fogos de réveillon: coloridos do
inusitado. É a fornalha de dentro dos ossos e dos suspiros.
O intervalo que se cria no
canto do olho.
Meus deuses, o que é o grau
dessa loucura? Peço socorro. A socorrida.
Dá-me, dessas mãos
escorregadias, o minúsculo entendimento de mim, do que sou, por quem vivo, para
ser mais exata diante de ti. Desmorono com tanta facilidade por conta
desse tal entendimento que busco.
Rogo.
O que pensara gora, que já me
vejo lúcida e com uma luz que ataca profundamente meus olhos de tons quentes e
marrons? Serei cega para todo o resto, mas ainda consigo chegar a alguém que
também se esbarra no não entendimento de toda a coisa pulando tão viva.
Ataca os desprevenidos e desajustados
para o cotidiano.
Um rolo de filme anda e se
forma para o legado interminável dos atos. Ė o tempo inescapável e irrecusável
que urge. A sentinela da ficção foi escrita. Eis a crueldade de se guardar o
inescrupuloso instante na palma da mão e movediço na cabeça.
A engrenagem do poema? Uma
noveleta? A ficção! Que se faça agora, mas diga o necessário entre os dentes,
condensando o ar morno que se respira pesadamente.
Essa novela depois de
estruturada de vida de gente, com meios, inícios e fins ou já iniciada de um
fim será a vida caindo da ponte dos desejos? Que se ajustem aos meus ossos
então.
Quero saltar do alto, no
colapso de uma realidade entendida.
Embuste! Frio e torto
continua meu lábio trêmulo. Escárnio e malícia na cara são suficientes para
me acalmar. Estou tão viva e ainda não morri por nada. Tudo tão estampado
em minha pele viva, como tatuagens finalizadas agora.
Venho de uma desordem
tempestiva. Ouça. Grunhidos pesados e altos saem desse ser. Gemidos
para todos e por todos. Perdição? Pudera. Não. O encontro mais
impossível e real.
Dois mundos. O escrito e o
não escrito. A ficção e o tato.
O que morre é a sensação, o
que deixa de ser. O eu desassistido e sem proteção.
Eles - todos eles -,
precisam saber que existo para essa necessidade. Tenho tanta urgência como a
tinta fresca que se borra em busca da forma disfarçada e esfumaçada
entrecortando o ambiente novo. Sou tão nova e inventada agora como essa
pintura. Mas me vejo borrada num recorte de tempo em que existo e não sei bem
ao certo me dar um nome e dizer quem sou, quando me perguntarem algo com
interesse em alguma descoberta de vida íntima.
Ah, ele quer saber, insiste
que eu o diga, que da minha boca trêmula saiam palavras desajustadas e faladas
diretamente de mim, pronunciadas, verborrágicas. Ditas.
Tão desprotegida estou.
Envergonhada de tudo o que me assemelha. Entortilhada.
Deixa ele saber quem sou. É
melhor assim para os dois lados. Há o temor sentido e o ruído criado.
Constantes. Aéreos no espaço-tempo.
Linda a tua escrita! Parabéns pelo blog de muito bom gosto e delicadezas.
ResponderExcluirCarolina que maravilha sua visita! Fico tão feliz em saber que gostou,sempre bem-vinda, beijos.😍
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