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Tudo manifesta nossa mania de ver o
outro. Sabemos e somos bem conscientes que temos esse lado observador,
perscrutador da presa fácil que se mostra sem saber a quem. Acontece em
qualquer lugar, é só alguém estar lá. Mesmo que não percebam - os observados -,
muitas vezes nos deixam extasiados diante de qualquer coisa que eles fazem, às
vezes nos tiram do chão por um simples olhar que lançam ao acaso, são infinitas
as intenções.
Já manifestei esse meu lado através da escrita. Minha mania é de longa
data, nem saberia dizer ao certo, mas faz tempo que brinco com o que acontece
dentro de mim - esse bendito mal da observação do outro. O outro que me cerca e
prende, onde eu estiver. É que desse outro que não me canso nunca. E peco
demasiado por ele, pois penso também por ele,
mas não dá para viver a vida de ninguém, ainda que seja na mais pura ficção
porque há sempre a volta ao lugar real.
De uns tempos para cá - também não saberia dizer quando começou essa
angústia - não desejo mais escrever uma linha de um poema sequer, pois algo me
esgotou nesse caleidoscópio de dores - sempre a dor do outro misturada à minha
delicada atração do olhar. Vou partir para outras formas de expor o que vejo.
Não deixarei de escrever jamais, mas meus poemas, só poucos saberão deles. Eles
existem e ficarão guardados, pois não tenho mais necessidade de revê-los, pelo
menos não agora, talvez lá no futuro.
A loucura de enxergar alguém ultrapassa qualquer experiência. Ver
alguém, um desconhecido praticamente nu, mostrando tudo o que sua vida lhe dá.
Às vezes eu não entendo, mas me esforço e desejo sobretudo continuar suas
histórias. É sobre isso que falo: nossa forma de conquistar o mundo, como um
personagem trilhando os caminhos do roteiro que alguém lhe passou, sem saber o
desfecho, muito menos o final.
Pude ver, mesmo antes dessa conversa toda, que escrevo somente pela
minha curiosidade que tantas vezes ultrapassa a vida do outro para ganhar uma
vida própria, diferente de tudo o que existe. Se posso dar formas a muitas
vidas e brinco com esse poder que me estilhaça toda, também posso esconder um
pouco desse mistério da minha criação, pois acredito que nem sempre é bom
mostrar tudo o que se tem, pode ser trágico demais. Prefiro esse atrevimento do
olhar às escondidas, que revela sem perceber.
Por tudo isso escrevemos: para dar formas ao que existe e ao que criamos
das nossas fantasias e histórias inventadas.
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